Olá! Eu sou o Chico Canella e essa é Um bom dia para uma boa semana! Uma newsletter quase semanal sobre temas quase cotidianos.
Essa semana ia escrever sobre raiva, depois sobre escrever toda semana, depois sobre ser serialização da escrita para se manter relevante, depois sobre nada. No entanto ontem, depois de dois meses, peguei meu kindle e retomei a leitura do livro da Paolla Carosella, Todas as sextas. E acabou que estava no justo momento no qual ela perde o pai. Um momento no qual a vida dela estava agitadíssima, morando em São Paulo, tocando o restaurante do Francis Mallmann, enfim colhendo os frutos dos esforços dela. E nesse momento é atravessada pela morte escolhida de seu pai. E é nesse momento que numa conversa com Francis, vai morar na Inglaterra para poder mudar um pouco de ares.
Na Inglaterra, trabalhava num restaurante e morava numa espécie de república para os trabalhadores. Tinha um quarto pequeno, numa casa estilo vitoriano, acredito que bem inglesa. E nesse momento acontece o ataque as torres gêmeas e rola um certo fechamento tanto do mundo, quanto das pessoas. E nesse momento de introspecção, Paolla desenha o que viria a ser seu primeiro restaurante. O Júlia. Uma sequência de eventos catastróficos culminaram no enclausuramento físico naquele quarto e essa reação em cadeia a levou a um exercício ativo de sua criatividade. Desenhou a cozinha, os uniformes, o salão, os pratos. É impressionante como quando vamos a um restaurante (nós pessoas comuns) poucas vezes nos apegamos a certos detalhes. Tem algo de muito corajoso em certas atitudes que tomamos. E vejo muita verdade nas decisões que leio dessa chef. Coragem de seguir e seguir acreditando. E isso é de uma forma algo que se conecta com o que aconteceu em seguida.
Quando o sono bateu, peguei o celular. Óbvio que peguei o celular ao invés de dormir. Abri o Tiktok e tem um rapaz que faz uma série chamada Cenas que mudaram a química do meu cérebro. Ontem vi uma com uma cena de Bojack Horseman. Assisti Bojack de forma quase compulsiva até um momento no qual deu pra mim. Num sei se tive medo do que poderia acontecer ou da identificação com o personagem principal. O que não vem ao caso, agora. A cena em si é de um momento em que Bojack está tentando fazer exercícios. Começa a correr e está na merda. Num determinado momento cai no chão. E uma sombra cobre seu rosto então ouvimos um personagem dizer: “Fica mais fácil, mas você tem que fazer isso todos os dias. Essa é a parte difícil”.
Ontem corri 18km. Não é a maior distância que vocês vão ver alguém correr, mas é uma distância considerável. Inclusive, nunca é sobre a distância, mas sim sobre a relação entre quem está correndo com a distância a ser percorrida. Da mesma maneira, nunca é sobre a velocidade que percorro a distância, mas sobre a relação entre a pessoa que se locomove pelo espaço com aquele tempo. Aquele tempo dedicado. Que tempo? O meu tempo? O tempo do relógio? O tempo dos acontecimentos? Isso já explode a minha mente.
Voltando aos 18km, não tenho medo das distâncias que preciso percorrer. Mas sou muito inseguro de como percorrê-las em alguns momentos. Então, ontem achei que precisava fazer tudo sozinho. Mesmo inseguro. Depois do aquecimento, não fiquei de conversinha nem de hahaha e parti. Nessa semana, não tinha passado bem, tive um dia de baixa na terça. Fiz febre e tive diarréia, isso quebrou minha rotina de treinos. Isso tudo contou para somar com a minha insegurança. Mas comecei bem. E todo mundo que passava por mim me deixava uma palavra, um sorriso ou um incentivo. Tive alguns problemas no caminho minha camiseta começou a assar meu mamilo, mesmo tendo passado vaselina e o ritmo começou a ir caindo levemente. Nisso já tinha passado Leblon, Ipanema, Copacabana e estava na Avenida Princesa Isabel rumo ao Aterro do Flamengo. Uma breve parada no aterro para reforçar a vaselina e segui. Hidratando bem, suplementando e com um pensamento maneiro, até o km 11. Esse km não passava de jeito nenhum. Muitos pensamentos de não vai conseguir, olha essa velocidade, você tá ridículo. E no 12 quebrei.
Ninguém é obrigado a acabar um treino. Na verdade, ninguém é obrigado a começar um treino. O Thi Ferreira, grande ser humano e excelente profissional, sempre nos lembra que a corrida é o nosso divertimento. Escolhemos estar ali e ninguém é obrigado a nada. Só que existe o comprometimento e existe a máxima: “Fica mais fácil, mas você tem que fazer isso todos os dias. Essa é a parte difícil”. E a máxima é importante de lembrar tanto na parte fácil quanto na parte difícil. Não esquecer ela é honrar os dois momentos. As duas fases. Os dois Chicos. O que fez 18km sobrando e o que fez 18km faltando. Pensando nisso consegui terminar meu treino. Com ajuda de uma amiga nos últimos 1,5km. Com o incentivo de todos meus amigos de assessoria. E com a presença das pessoas que me amam junto comigo.
Cada pessoa, quando para na frente da sua casa, no calçadão da orla, no bosque perto de casa ou na linha de partida de uma corrida, chegou ali por um motivo próprio. Esse motivo, tem nome, tem objetivo, tem caminhos. A rotina faz muitos movimentos pela gente. Ela nos mantem em pé. Ela organiza nossos dias. Ela nos organiza. O problema é quando ela nos é tão comum que conseguimos cumpri-la anestesiados. E vocês não imaginam como é comum ouvir pessoas falando na terapia sobre como em determinados momentos da vida estavam anestesiados. Sentir o que sentimos, por pior que seja, muitas vezes nos mantém em pé. Mantem nossa crença em nós, impõe a mudança necessária, coloca em xeque posturas, transforma nossa personalidade. É claro que existem excessões. Mas cada vez mais parece ser esse o padrão para aguentar a realidade. Fazer algo todos os dias, presente e com consciência, ainda parece ser a melhor atitude a se ter, vai deixando a vida mais fácil, mesmo sendo o difícil a se fazer.
Caso vocês gostem das discussões aqui levantadas e tenham vontade de responder, realmente estou aqui para trocar essa ideia. Além disso, se gostarem do conteúdo, indiquem para amigos que vocês acreditam que se beneficiarão desse papo.