Olá! Eu sou o Chico Canella e essa é Um bom dia para uma boa semana! Uma newsletter quase semanal sobre temas quase cotidianos.
Cada dia tem sido um dia e cada escolha tem sido uma escolha. Não consigo ainda retomar leituras, nem assistir a filmes ou séries que me peçam para pensar. Só o scroll e coisas que explodem ou coisas que são bobas. A raiva encontrou um caminho e agora fica mais o vazio e a tristeza grande, forte e intensa.
Como uma pessoa que já lida com a depressão e a trata, penso muito sobre o quanto deixar sentir e o quanto dosar o sentir. Mesmo não parecendo tão simples e tão possível, deixar sentir solto e sem vigília pode levar-me facilmente a um buraco profundo. O dosar sentir também. Reprimir, sublimar e esconder são lugares de certa “sabotagem” tipo tampar um buraco de um dente com um chiclete. É possível, mas não bloqueia a entrada de bactérias dentro do dente. E o que era um buraquinho pode tornar-se um buracão.
Não ficar parado é uma ideia que pra mim concilia o deixar sentir e o dosar sentir. Muitas pessoas ficam preocupadas com o falar e reviver. Não preciso falar para reviver. As vezes, uma pequena lembrança ou um mini gatilho puxa a conta toda. Então, se mexer é fundamental e necessário. Claro que não me refiro só a prática esportiva. No meu caso, até me ajuda, mas é impossível pensar na mera possibilidade desse ser o único recurso para não ficar parado. Não ficar parado é mais do que mexer-se geograficamente em algum espaço, consiste em ter a noção das forças e vetores que atuam num determinado momento.
Quando você estudou física na escola, com certeza teve uma questão de um cubo num plano inclinado. Se um objeto cúbico está num plano inclinado parado quais são as forças que atuam sobre ele?
O angulo da inclinação, o peso, a gravidade e o atrito são exemplos de forças que atuam sobre o objeto cubico. Se o atrito for maior que tudo isso ele seguirá parado. Se não existir o atrito, o cubo encontrará sem piedade o final do plano. O plano não é ignorar o que nos prende. É entender para poder elaborar. Uma prancha de surfe tem um atrito muito baixo, para isso o surfista passa parafina nela. Assim como um shape de skate sem lixa e por ai vai. Para performar todas as manobras que esses esportes exigem, é necessário ter a “prisão” do atrito e não o grupe de uma amarra. Preso o bastante para estar solto quando necessário.
Essa relação entre as forças e os corpos é algo que sem dúvida não é simples de administrar. As vezes, as forças são muito grandes e uma descida em queda livre se torna o final para um objetivo. As vezes, o atrito é tão grande que ficamos parados e imóveis no momento de nossas dores, nos desafios, na vida. É importante ter um plano e seguir o plano sempre que possível. Mas em alguns momentos, nada sai como o planejado e precisamos ter força para contornar isso. Como disse, e já citei mais de uma vez aqui, Rocky Balboa para seu filho: A vida não é um arco-íris, um conto de fadas. Ninguém vai bater tão forte quanto a vida. Mas é nesse momento que sabemos quem somos. É quando atingimos um ponto inimaginável que podemos dizer quem somos.
Quais são as forças que atuam sobre nós todos os dias? Vontade, desejo, saudade, amor, tristeza. Forças que nos paralisam, forças que nos movem. Forças que nos fazem encontrar sentido. Ou sentidos. Por enquanto, sigo procurando sentido para seguir aqui escrevendo, comunicando e construindo essa rede.
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Agradeço por mais um texto gostoso de ler! Eu não pensava nas propriedades dos objetos nem nos vetores de força há muito tempo. Achei a alegoria ótima: quanto mais denso e pesado o objeto, mais inerte. Quanto mais leve, maior a chance de deslizar. Por isso a gente (que tem mania de profundidade) tá sempre buscando leveza, né? Buscando instantes de leveza pra deslizar n’água, pra deslocar pelo mundo e pra viver no presente.